A Linguagem Como Ato de Liberdade

A linguagem não é apenas um instrumento de comunicação. É também um instrumento de ação, de transformação e de construção do mundo. Quando nos debruçamos sobre os mecanismos que regem a língua, como a regência verbal e nominal, não estamos apenas memorizando regras gramaticais: estamos nos apropriando da nossa capacidade de expressar, interpretar e interagir com o mundo com mais consciência e precisão.

Neste artigo, vamos compreender profundamente o que é regência verbal e nominal, com foco no uso das preposições corretas. A abordagem será dialógica e reflexiva, respeitando o processo de construção do conhecimento de quem lê. O objetivo é que cada estudante perceba a lógica por trás da língua, questionando-a quando necessário, e não apenas se submetendo a ela.


Parte 1 – O Que É Regência? Um Encontro Entre Palavras

A regência é o mecanismo pelo qual uma palavra principal (verbo ou nome) exige a presença de outra palavra para completar seu sentido, geralmente ligada por uma preposição.

Assim como em qualquer relação, há uma necessidade de harmonia entre os termos. E essa harmonia exige escuta, sensibilidade e atenção. É preciso perceber que, por trás da regra gramatical, existe um modo de pensar e organizar a realidade.

Regência Verbal: O Verbo Que Pede

Na regência verbal, um verbo necessita de um complemento, que pode vir acompanhado ou não de preposição. Por exemplo:

  • “Ele gosta de música.”
  • “Ela aspira a uma promoção.”

Note que os verbos “gostar” e “aspirar” exigem preposições específicas. Ignorar essa exigência compromete o sentido e a clareza da frase.

Regência Nominal: O Nome Que Pede

Na regência nominal, o substantivo, adjetivo ou advérbio estabelece uma relação com outro termo por meio de uma preposição:

  • “Tenho orgulho de você.”
  • “Ela está ansiosa por notícias.”

Aqui, a sensibilidade está em perceber que não é apenas a palavra principal que tem sentido, mas a relação entre os termos que a linguagem permite construir.


Parte 2 – Regência Verbal: Sentir o Verbo, Entender o Sentido

Vamos aprofundar nosso olhar sobre a regência verbal. Antes de decorar, é essencial compreender o sentido do verbo. Veja alguns exemplos e suas exigências:

Verbos que exigem a preposição “a”:

VerboExemplo
Assistir (ver)Assisti ao filme.
Aspirar (almejar)Aspiro a uma carreira promissora.
ObedecerObedeço às regras.
PertencerEste livro pertence a mim.

Importante: O verbo assistir no sentido de “ajudar” não exige preposição: “Assisti o paciente com carinho.”

Verbos que exigem a preposição “de”:

VerboExemplo
GostarGosto de música clássica.
PrecisarPreciso de tempo.
Esquecer / LembrarEsqueci do nome dele.
DuvidarDuvido da veracidade da notícia.

Atenção: Se o complemento for um pronome oblíquo átono (o, a, os, as), a preposição pode ser omitida: “Esqueci-o.”

Verbos que exigem a preposição “com”:

VerboExemplo
SonharSonho com um mundo melhor.
ConcordarConcordo com suas ideias.
CasarEla se casou com um engenheiro.

Parte 3 – Regência Nominal: Quando o Substantivo Também Exige

Muitos substantivos, adjetivos e advérbios também exigem preposições. Assim como os verbos, é necessário perceber o sentido da relação.

Substantivos com preposição

SubstantivoPreposiçãoExemplo
AmorporAmor por animais.
MedodeMedo de altura.
OrgulhodeOrgulho de suas conquistas.
Ódioa / porÓdio a injustiças.

Adjetivos com preposição

AdjetivoPreposiçãoExemplo
AnsiosoporAnsioso por novidades.
Gratoa / porGrato a você por tudo.
ResponsávelporEle é responsável por essa tarefa.
ContentecomContente com os resultados.

Parte 4 – Erros Comuns e Como Evitá-los: Da Repetição à Compreensão

Vamos analisar alguns dos erros mais comuns na regência e o que eles revelam:

1. Omissão da preposição

Errado: Obedeceu as regras.
Certo: Obedeceu às regras.

→ A omissão da preposição “a” compromete o verbo que exige regência. Isso geralmente ocorre por automatismo ou desconhecimento.

2. Troca da preposição

Errado: Gosto com música.
Certo: Gosto de música.

→ Cada verbo tem uma relação histórica e semântica com a preposição correta. Trocar a preposição é trocar o sentido.

3. Redundância

Errado: Aspirar por uma carreira.
Certo: Aspirar a uma carreira.

→ Algumas expressões populares usam preposições que não são exigidas, o que gera construções redundantes.


Parte 5 – A Regência no Cotidiano: O Texto Como Prática de Liberdade

Dominar a regência verbal e nominal é mais do que atender a uma exigência gramatical. É resgatar a capacidade de dizer com precisão e autonomia. Quando compreendemos as relações entre os termos, ampliamos nosso repertório e nossa clareza.

Em mensagens e redes sociais

Mesmo em textos informais, conhecer a regência nos ajuda a manter a coerência:

  • “Estou com saudade de você” → e não: “com saudade você”.
  • “Vou assistir ao documentário hoje.” → e não: “assistir o documentário”.

Em contextos acadêmicos e profissionais

Uma redação do ENEM ou um e-mail profissional perde credibilidade quando apresenta erros básicos de regência. Mas mais que isso: perde-se a força da mensagem, e com ela, a oportunidade de se posicionar com clareza.


Parte 6 – Caminhos para a Autonomia Gramatical

Ninguém nasce sabendo. Aprender a regência é um processo dialógico, que se constrói na escuta, na leitura e na prática diária. Veja algumas sugestões:

1. Leitura atenta

Ler bons textos ajuda a internalizar padrões corretos. Preste atenção nos verbos e nos nomes que aparecem com frequência: como eles se relacionam com os outros termos?

2. Produção consciente

Ao escrever, pergunte-se: “Esse verbo exige preposição? Qual?” Faça revisões focadas nisso.

3. Consultas confiáveis

Use dicionários de regência verbal e nominal. Um bom exemplo é o Dicionário de Regência Verbal de Celso Luft ou Evanildo Bechara.

4. Escuta ativa

Ouvir como as pessoas falam — especialmente em registros mais formais — também é uma forma de aprender.


Parte 7 – Regência e Emancipação: A Linguagem Como Potência

A regência verbal e nominal, quando compreendida, não é uma prisão. Pelo contrário, é uma chave de liberdade. Escolher a preposição certa é escolher o sentido certo. É se apropriar da linguagem como forma de existência plena.

Ao dominar a regência, você não está apenas escrevendo corretamente. Você está pensando com clareza, se expressando com liberdade e construindo pontes com os outros.

E como todo aprendizado verdadeiro, esse processo é contínuo, coletivo e transformador.


Conclusão: O Conhecimento Como Prática

A regência não é uma coleção de regras a serem decoradas, mas uma prática que se aprende, se vive e se reflete. O uso correto da preposição é um passo para escrever melhor, falar com mais segurança e ser compreendido plenamente.

Aprender regência é, no fundo, aprender a escolher a palavra certa para o momento certo — e isso é uma forma de sabedoria.

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