cadeira de rodas

Não queria fazer natação, ping-pong, corrida, como as pessoas que a mídia mostra, só queria me movimentar pra ganhar qualidade de vida e perder peso.

Marcela Cálamo Vaz Silva*

Cadeirante desde os seis anos, fiz fisioterapia no período de reabilitação e uns poucos meses em casa. A vida seguiu e deixei essa coisa de fisioterapia pra lá.

A vida seguiu mais adiante, minhas atividades físicas passaram a ser as mesmas de qualquer pessoa que cuida de casa, filhos, marido. Não posso dizer que vivia uma vida sedentária, pois vivia atrás de filhos, subindo e descendo as rampas de minha casa, no entanto, não era exatamente uma atividade física. Tarefas rotineiras, cansativas, mas de poucos benefícios.

Numa das voltas da vida, saí da casa onde morava pra morar num condomínio. Morando no térreo, num apartamento menor do que a casa, mais fácil de limpar, arrumar, fui me sentindo preguiçosa, sedentária. E veio, pela primeira vez, a ideia de procurar alguém que me ajudasse a sair desse sedentarismo, um personal trainer.

Eu não queria ser atleta. Não queria fazer natação, ping-pong, corrida, como as pessoas que a mídia mostra, só queria me movimentar pra ganhar qualidade de vida e perder peso.

Como mágica, Jailson apareceu. Ele postou na comunidade do condomínio no Facebook que dava aulas de treinamento funcional para cadeirantes. Eu nunca tinha ouvido falar nisso, mas entrei em contato imediatamente. Eu seria sua primeira aluna, aprenderíamos juntos. Foi então que minha vida começou a mudar…

Começamos, em agosto, a treinar com elásticos, bola, pesinhos etc, testando força, equilíbrio, agilidade. No começo tudo era difícil, mas fui vencendo as etapas. Saímos da sala de ginástica e passamos a usar a pista de bocha. Começamos com os circuitos com exercícios variados. Corridas rápidas, paradas bruscas (reativei a rodinha anti-tombo), rodar de ré, contornar cones, enfim, atividades que fazem parte de meu dia a dia, mas nem percebo.
No Natal, uma surpresa: sem perceber estava usando as duas mãos ao mesmo tempo, com braços erguidos sem apoio, pra fazer um doce. Comecei a observar meus ganhos: lavar a cabeça com as duas mãos, me abaixar para pegar algo do chão e levantar quase sem apoio, fazer movimentos com o tronco que jamais fiz, aumento de força e outros mais.

Continuamos em frente, fazendo treinos com circuitos de exercícios variados, corridas contra o tempo, exercícios com corda, com Jailson sempre impondo um novo desafio com dificuldade e intensidade crescentes.

Penso em tantos outros cadeirantes que, assim como eu, não querem ser atletas, mas sentem necessidade de se movimentar, de ter ajuda de um profissional mas não acham um “Jailson” ou não têm espaço adequado ao exercício.. Penso em quantos “Jailsons” têm qualificação, vontade de praticar seus conhecimentos, mas não acham uma “Marcela” para treinar.
E penso, enfim, que eu, cadeirante há mais de 40 anos, que só queria perder uns quilos, achando que minha condição física era estática, surpreendo-me a cada evolução e torço para que mais e mais pessoas descubram o treinamento funcional e surpreendam-se também.


* Marcela Cálamo Vaz – 47 anos é mãe de dois meninos, Ricardo (15 anos) e Luís Felipe(9anos), autora do livro infantil “Rodas, pra que te quero!” e professora particular. Mantém o blog Maré (tchela.blogspot.com).

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